Segundo Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Preto
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PERMUTA COM TORNA: QUAL O LIMITE?

A permuta, ou troca, consiste na contratação para a entrega de uma coisa por outra, desde que não seja dinheiro.


Os objetos da permuta, portanto, serão sempre bens alienáveis, podendo ser, ou não, da mesma espécie. Assim, pode haver a troca de um bem imóvel por outro bem de natureza diversa, como veículo, por exemplo.


Ainda, poderão ser atribuídos valores iguais ou diferentes aos bens permutados.


Se os valores dos bens objeto da troca forem diferentes, haverá a “torna”, ou seja, haverá a complementação de uma parte do valor em dinheiro.


Assim, verifica-se que até pode existir um determinado valor “in pecunia”, todavia, tal quantia jamais pode ser superior à metade do valor total do negócio.


Isto equivale a dizer hipoteticamente que, se a um bem imóvel é atribuído o valor de R$ 100.000,00, o valor do outro bem com ele permutado não poderá ser inferior a R$ 50.000,00 (50%), pois somente assim o valor pago em dinheiro será inferior a 50% do valor total do negócio, não descaracterizando a permuta.


Se assim não fosse, isto é, se a torna (pagamento em dinheiro) fosse superior a 50% do valor total do negócio, não se poderia falar na contratação de permuta, mas sim na realização de venda e compra com dação em pagamento.


O que diferencia a permuta da venda e compra é justamente o valor que se atribui aos bens, já que a venda e compra é o negócio pelo qual se entrega uma coisa pelo pagamento de um preço.


Assim, se a contraprestação em dinheiro corresponder a mais do que 50% do valor do negócio jurídico entabulado, o que está sendo celebrado é o contrato de venda e compra, e não a permuta, conforme estabelecido no artigo 481 do Código Civil. 


Nesse sentido, a doutrina menciona:

“O objeto da permuta hão de ser dois bens. Eventualmente, se um dos contraentes der dinheiro ou prestar serviços, não haverá troca, mas compra e venda.

[...] a) Na troca, ambas as prestações são em espécie (coisas são trocadas), enquanto na compra e venda a prestação do comprador é em dinheiro ou em dinheiro e outra coisa (a entrega do dinheiro seria um complemento ao pagamento feito mediante a entrega de uma coisa em valor menor ao da prestação estipulada).

b) Na compra e venda, o vendedor, uma vez entregue a coisa vendida, não poderá pedir-lhe a devolução no caso de não ter recebido o preço, enquanto na troca o tradente terá o direito de repetir o que deu se a outra parte não lhe entregar o objeto permutado.” (DINIZ, Maria Helena. In TARTUCE, Flávio, “Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie”, 8ª ed. São Paulo: Método, 2013, p.300/301).

 

A jurisprudência reforça tal posicionamento: 

“REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA - INSTRUMENTO PARTICULAR DE PROMESSA DE PERMUTA DE IMÓVEIS – TÍTULO COM NATUREZA JURÍDICA DIVERSA DA DENOMINAÇÃO QUE LHE FOI DADA – VERDADEIRO CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA – RÓTULO DO CONTRATO QUE NÃO PODE SERVIR DE ÓBICE AO SEU REGISTRO QUANDO SEU CONTEÚDO ESTÁ DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS REGISTRAIS - RECUSA AFASTADA, COM OBSERVAÇÃO. [...] Instrumento particular de promessa de permuta - Possibilidade de registro desde que assim caracterizado - Inocorrência no caso em exame - Contrato com rótulo de instrumento particular de promessa de permuta, mas que representa desde logo o negócio definitivo. [...] No caso em exame, embora se tenha dado o nome de promessa de permuta ao instrumento particular, está-se diante de contrato de promessa de compra e venda, uma vez que a parte em dinheiro dada em “permuta” é muito maior do que a em lotes. Orlando Gomes, ao falar do contrato de compra e venda, explica que: O preço é a ‘quantia’ que o comprador se obriga a pagar ao vendedor. Elemento essencial no contrato, “sine pretio nula venditio”, dizia Ulpiano. Deve consistir em ‘dinheiro’. Se é outra coisa, o contrato define-se como ‘permuta’ ou ‘troca’. Não se exige, contudo, que seja exclusivamente dinheiro, bastando que constitua a parcela principal. Para se saber se é ‘venda’ ou ‘troca’, aplica-se o princípio ‘major pars ad se minorem trahit’; venda, se a parte em dinheiro é superior; troca, se é o valor do imóvel.  [...] Não se trata, portanto, de troca, negócio jurídico por meio do qual os contratantes se obrigam a prestar uma coisa por outra diversa de dinheiro. Inexiste a alienação de uma coisa por outra, mas a venda de área de 62,3848ha, sendo que apenas pequena parte do pagamento será efetuada mediante a entrega de lotes; o resto, em dinheiro. Isso não impede, contudo, o registro pretendido, pois, conforme destacado nos precedentes acima, não importa o rótulo do contrato, mas sim o seu conteúdo. [...]”. (g.n.)

 (CSM. Ap. Cív. 9000002-48.2013.8.26.0101. D.J.: 21/10/2014).


E, mais:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Recurso de Apelação – Instrumento particular de promessa de permuta – Possibilidade de registro desde que assim caracterizado – Inocorrência no caso em exame – Contrato com rótulo de instrumento particular de promessa de permuta, mas que representa desde logo o negócio definitivo – Inexistência de obrigação de as partes declararem vontade futura ou de celebrar o contrato definitivo – Necessidade de escritura pública na forma do art. 108, do Código Civil – Recurso não provido. [...] Pretende-se, assim, em caráter já definitivo, dividir o patrimônio comum existente a fim de se atribuir a propriedade exclusiva de determinados bens às pessoas ali indicadas, o que não se confunde com a troca que, como se sabe, é o negócio jurídico por meio do qual os contratantes se obrigam a prestar uma coisa por outra diversa de dinheiro; a alienação de uma coisa por outra. [...].” (g.n.)

(CSM. Ap. Cív. nº 0006797-56.2012.8.26.0071. D.J.: 26/06/2013.).


Portanto, zelando pela segurança jurídica e a fim de dar publicidade a informações que certamente exprimam a verdade dos fatos, esta serventia, ao qualificar os títulos, sempre analisa se o negócio jurídico realizado entre as partes é a permuta ou a venda e compra com dação em pagamento, verificando os critérios norteadores acima elencados.