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NCPC: Suas Alterações e as Serventias Extrajudiciais (Parte 1)

NCPC: Suas Alterações e as Serventias Extrajudiciais (Parte 1)

O NCPC passou a ter vigência em março de 2016. Esta lei tem diversos impactos nas atividades das serventias extrajudiciais.


Com ele, foram introduzidas novas disciplinas, implementadas melhorias e excluídas algumas disposições processuais.


Dentre os motivos ensejadores de sua criação, podem ser citados como primordiais a proteção dos valores garantidos constitucionalmente e a efetividade do processo.


A elaboração do novo texto de lei consistiu basicamente em positivar, trazer para o texto legal, muito do que já vinha sendo posto em prática. Assim, o ingresso da jurisprudência no texto da lei proporciona a redução das demandas sobre os temas.


Portanto, embora alguns assuntos não sejam inovações, importante é ressaltar cada um deles de modo a esclarecer o que de fato foi abrangido pelas modificações da lei processual civil.


Em resumo apertado, buscou-se elencar as alterações da norma processual que de certa forma impactam na atuação das serventias extrajudiciais, notadamente os registros de imóveis. São elas:



1. Competência


O artigo 53 do NCPC (sem correspondente no CPC/73) dispõe que:


“Art. 53. É competente o foro:

[...]

III – do lugar:

[...]

f) da sede da serventia notarial ou de registro, para a ação de reparação de dano por ato praticado em razão do ofício;

[...]”


O citado artigo 53, III, do NCPC, definiu como competente o foro do local da serventia cujo titular supostamente lesou o autor da demanda.


A norma em questão foi criada para proteger o usuário do serviço. Não será competente o domicílio do réu (oficial), mas sim aquele da localidade em que estiver situado o respectivo cartório.



2. Gratuidade da Justiça e Gratuidade Emolumentar


O artigo 98 do NCPC (sem comparativo no CPC/73) estabelece que:


“Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

§1º - A gratuidade da justiça compreende:

[...]

IX - os emolumentos devidos a notários e registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido.

[...]

§8º - Na hipótese do §1º, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos de gratuidade, o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento de que trata o §6º deste artigo, caso em que o beneficiário será citado para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento”.


Esta não é uma inovação, já que a justiça gratuita era disciplinada pela lei nº 1060/1950.


O NCPC revogou parte dessa lei e passou a dispor sobre esta matéria, incorporando diversos entendimentos jurisprudenciais consolidados durante os últimos anos. Ampliou-se o rol de possíveis beneficiários, incluindo, por exemplo, as pessoas jurídicas e os estrangeiros.


Ademais, a justiça gratuita passou a compreender os emolumentos devidos aos notários e registradores, abrangendo, portanto, os atos de registro e de averbação e os atos notariais.


Não é uma nova criação, na medida em que a lei acima citada, da década de 50, estabelecia que o benefício se estendia aos serventuários da justiça, dispositivo pelo qual alguns julgadores estendiam a sua aplicação também para os registros de imóveis e notários.


Contudo, o mesmo artigo acima mencionado, em seu parágrafo 8º, dispõe de forma inovadora, na medida em que dispõe sobre a possibilidade de  verificação dos motivos ensejadores da benesse da gratuidade, o que deverá ser posterior à prática dos atos.


O oficial ou o tabelião poderá provocar o corregedor permanente para rever a aplicação do benefício para aquele beneficiado com o ato. Portanto, a gratuidade que aqui se menciona não é algo absoluto, mas sim apenas e tão somente uma suspensão da possibilidade de exigir os emolumentos.


De todo modo, este dispositivo é bastante criticado, na medida em que se questiona sobre a forma e a competência para a revisão da mencionada gratuidade, o que torna necessário aguardar a construção jurisprudencial sobre o tema.



3. Citação e intimação


Sobre a citação e a intimação, os artigos 248, 252, 253 e 275, do NCPC (sem correspondentes no novo CPC), estabelecem que:


Art. 248. Deferida a citação pelo correio, o escrivão ou o chefe de secretaria remeterá ao citando cópias da petição inicial e do despacho do juiz e comunicará o prazo para resposta, o endereço do juízo e o respectivo cartório.

[...]

§ 4º Nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso, será válida a entrega do mandado a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, que, entretanto, poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente.


Art. 252. Quando, por 2 (duas) vezes, o oficial de justiça houver procurado o citando em seu domicílio ou residência sem o encontrar, deverá, havendo suspeita de ocultação, intimar qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no dia útil imediato, voltará a fim de efetuar a citação, na hora que designar. Parágrafo único. Nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso, será válida a intimação a que se refere o caput feita a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência.


Art. 253. No dia e na hora designados, o oficial de justiça, independentemente de novo despacho, comparecerá ao domicílio ou à residência do citando a fim de realizar a diligência.

§ 1º Se o citando não estiver presente, o oficial de justiça procurará informar-se das razões da ausência, dando por feita a citação, ainda que o citando se tenha ocultado em outra comarca, seção ou subseção judiciárias. 

§ 2º A citação com hora certa será efetivada mesmo que a pessoa da família ou o vizinho que houver sido intimado esteja ausente, ou se, embora presente, a pessoa da família ou o vizinho se recusar a receber o mandado.

§ 3º Da certidão da ocorrência, o oficial de justiça deixará contrafé com qualquer pessoa da família ou vizinho, conforme o caso, declarando-lhe o nome. 

§ 4º O oficial de justiça fará constar do mandado a advertência de que será nomeado curador especial se houver revelia.


Art. 275. A intimação será feita por oficial de justiça quando frustrada a realização por meio eletrônico ou pelo correio.

[...]

§ 2º Caso necessário, a intimação poderá ser efetuada com hora certa ou por edital.



4. Ata Notarial


O artigo 384 do NCPC (sem comparativo no CPC/73) prevê que:


“Art. 384. A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.

Parágrafo único. Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.”


Com o novo texto legal, regulamentou-se a ata notarial como prova típica. Sob o ponto de vista formal, não foram introduzidas modificações, mas agora passa a estar regulada na norma processual civil.



5. Autenticidade do Documento


Sobre a autenticidade do documento, o artigo 411 do NCPC (correspondente ao artigo 369 do CPC/73) estabeleceu que:


Art. 411. Considera-se autêntico o documento quando: 

I – o tabelião reconhecer a firma do signatário

II – a autoria estiver identificada por qualquer outro meio legal de certificação, inclusive eletrônico, nos termos da lei; 

III – não houver impugnação da parte contra quem foi produzido o documento.



6. Hipoteca Judiciária


Dispõe o artigo 495 do NCPC (correspondente ao 466 do CPC/73) que:


Art. 495. A decisão que condenar o réu ao pagamento de prestação consistente em dinheiro e a que determinar a conversão de prestação de fazer, de não fazer ou de dar coisa em prestação pecuniária valerão como título constitutivo de hipoteca judiciária.

§ 1o A decisão produz a hipoteca judiciária:

I - embora a condenação seja genérica;

II - ainda que o credor possa promover o cumprimento provisório da sentença ou esteja pendente arresto sobre bem do devedor;

III - mesmo que impugnada por recurso dotado de efeito suspensivo.

§ 2o A hipoteca judiciária poderá ser realizada mediante apresentação de cópia da sentença perante o cartório de registro imobiliário, independentemente de ordem judicial, de declaração expressa do juiz ou de demonstração de urgência.

§ 3o No prazo de até 15 (quinze) dias da data de realização da hipoteca, a parte informá-la-á ao juízo da causa, que determinará a intimação da outra parte para que tome ciência do ato.

§ 4o A hipoteca judiciária, uma vez constituída, implicará, para o credor hipotecário, o direito de preferência, quanto ao pagamento, em relação a outros credores, observada a prioridade no registro.

§ 5o Sobrevindo a reforma ou a invalidação da decisão que impôs o pagamento de quantia, a parte responderá, independentemente de culpa, pelos danos que a outra parte tiver sofrido em razão da constituição da garantia, devendo o valor da indenização ser liquidado e executado nos próprios autos. 


As garantias podem ser reais ou pessoais (fidejussórias). Dentre as reais, há 4 tipos: penhor, anticrese, alienação fiduciária e hipoteca.


Com a constituição da hipoteca, um imóvel fica garantindo o cumprimento de uma obrigação. Ela pode ser de três naturezas: convencional (estabelecida entre as partes em contrato), legal (prevista no art. 1.489, CC) ou judiciária.


Esta última, a judiciária, tem um efeito anexo à sentença. Ele é um efeito secundário, que se produz independentemente da vontade do agente, que é o Estado-juiz.


Os efeitos da hipoteca resultam automaticamente da lei.


Tanto é um efeito automático que a jurisprudência do STJ consagrou que, mesmo que a sentença afirme não acarretar a hipoteca judiciária, ela será produzida sim como efeito.


A hipoteca judicial ou judiciária, tratada pelo NCPC no art. 495, será constituída pela decisão condenatória de soma em dinheiro e também por aquela que prevê a conversão de prestação específica em prestação pecuniária.


A sua maior função é a prevenção contra a fraude à execução. A hipoteca tem sequela. Uma vez registrada, o direito do exequente fica resguardado.


Ademais, a hipoteca judiciária passará a gerar não mais somente a sequela, mas também acarretará o direito de preferência, o que não ocorria anteriormente. Agora, o exequente terá um bem a garantir a sua execução e também o direito de preferência em receber o produto da venda deste bem.


A hipoteca judiciária pode ser objeto de registro pela simples apresentação da decisão judicial perante o cartório de registro de imóveis.


A inovação consiste na inexistência da necessidade de requerimento ao juiz. Embora na prática se aceitasse a decisão, agora há previsão expressa no sentido de ser a própria sentença suficiente para que se procede ao ato de registro em questão.


Até 15 dias após o registro, a parte deverá informar o juízo a respeito da realização do ato de registro da hipoteca judiciária.


Há, portanto, um novo regime para a hipoteca.



7. Protesto de decisão judicial transitada em julgado


O artigo 517 do NCPC (sem comparativo no CPC/73) incluiu no rol previsto no art. 1º da Lei nº 9.492/1997 o título judicial como um “documento de dívida” passível de protesto:


Art. 517. A decisão judicial transitada em julgado poderá ser levada a protesto, nos termos da lei, depois de transcorrido o prazo para pagamento voluntário previsto no art. 523. 

§ 1º Para efetivar o protesto, incumbe ao exequente apresentar certidão de teor da decisão. 

§ 2º A certidão de teor da decisão deverá ser fornecida no prazo de 3 (três) dias e indicará o nome e a qualificação do exequente e do executado, o número do processo, o valor da dívida e a data de decurso do prazo para pagamento voluntário. 

§ 3º O executado que tiver proposto ação rescisória para impugnar a decisão exequenda pode requerer, a suas expensas e sob sua responsabilidade, a anotação da propositura da ação à margem do título protestado. 

§ 4º A requerimento do executado, o protesto será cancelado por determinação do juiz, mediante ofício a ser expedido ao cartório, no prazo de 3 (três) dias, contado da data de protocolo do requerimento, desde que comprovada a satisfação integral da obrigação. 



8. Patrimônio de Afetação


O artigo 533 do NCPC (correspondente ao artigo 475-Q do CPC/73) trouxe uma nova modalidade de patrimônio de afetação, a qual se aplica à hipótese de constituição de capital para assegurar o pagamento de pensão mensal que decorre de condenação ao pagamento de indenização por ato ilícito:


Art. 533. Quando a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, caberá ao executado, a requerimento do exequente, constituir capital cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da pensão.

§ 1o O capital a que se refere o caput, representado por imóveis ou por direitos reais sobre imóveis suscetíveis de alienação, títulos da dívida pública ou aplicações financeiras em banco oficial, será inalienável e impenhorável enquanto durar a obrigação do executado, além de constituir-se em patrimônio de afetação.

§ 2o O juiz poderá substituir a constituição do capital pela inclusão do exequente em folha de pagamento de pessoa jurídica de notória capacidade econômica ou, a requerimento do executado, por fiança bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado de imediato pelo juiz.

§ 3o Se sobrevier modificação nas condições econômicas, poderá a parte requerer, conforme as circunstâncias, redução ou aumento da prestação.

§ 4o A prestação alimentícia poderá ser fixada tomando por base o salário-mínimo.

§ 5o Finda a obrigação de prestar alimentos, o juiz mandará liberar o capital, cessar o desconto em folha ou cancelar as garantias prestadas.



9. Ação de divisão de terras e de demarcação de terras


A averbação do georreferenciado do imóvel dispensa a realização da perícia para as ações de divisão de terras ou demarcação de terras, consoante artigo 573 do NCPC (sem correspondente no CPC/73):


Art. 573. Tratando-se de imóvel georreferenciado, com averbação no registro de imóveis, pode o juiz dispensar a realização de prova pericial.



10. Inventário/Separação e Divórcio/Dissolução da União Estável


Foram incluídas no NCPC as previsões expressas dos procedimentos extrajudiciais de inventário, separação, divórcio e dissolução da união estável. Estas previsões são manifestações já existentes da desjudicialização das questões não contenciosas:


Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial.

§ 1o Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.

§ 2o O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.”


“Art. 733. O divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual de união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes e observados os requisitos legais, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições de que trata o art. 731.

§ 1o A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.

§ 2o O tabelião somente lavrará a escritura se os interessados estiverem assistidos por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.”



11. Penhor Legal


O artigo 703 do NCPC (correspondente ao artigo 874 do CPC/73) prevê a possibilidade de homologação pelo notário do penhor legal que recai sobre bens móveis no caso de locador e hospedeiro:


Art. 703. Tomado o penhor legal nos casos previstos em lei, requererá o credor, ato contínuo, a homologação.

§ 1º Na petição inicial, instruída com o contrato de locação ou a conta pormenorizada das despesas, a tabela dos preços e a relação dos objetos retidos, o credor pedirá a citação do devedor para pagar ou contestar na audiência preliminar que for designada.

§ 2º A homologação do penhor legal poderá ser promovida pela via extrajudicial mediante requerimento, que conterá os requisitos previstos no § 1º deste artigo, do credor a notário de sua livre escolha.

§ 3º Recebido o requerimento, o notário promoverá a notificação extrajudicial do devedor para, no prazo de 5 (cinco) dias, pagar o débito ou impugnar sua cobrança, alegando por escrito uma das causas previstas no art. 704, hipótese em que o procedimento será encaminhado ao juízo competente para decisão. 

§ 4º Transcorrido o prazo sem manifestação do devedor, o notário formalizará a homologação do penhor legal por escritura pública.


Ver continuação do artigo: NCPC: Suas Alterações e as Serventias Extrajudiciais (Parte 2)